segunda-feira, 21 de abril de 2008

Dos chatos

O maior chato é o chato perguntativo. Prefiro o chato discursivo ou narrativo, que se pode ouvir pensando noutra coisa... Me lembro que fiz um soneto inteiro — bem certinho, bem clássico e tudo — durante o assalto ao Quarto do Sétimo, isto é, quando um veterano de 30 me contava mais uma vez a sua participação nas glórias e perigos daquela investida.

As velhotas que nos contam seus achaques também são de grande inspiração poética.

Mas que fazer contra a amabilidade agressiva do chato solícito? Aquele que insiste em pagar nossa passagem, nosso cafezinho, ou quer levar-nos à força para um drinque, ou faz questão fechada de nos emprestar um livro que não temos a mínima vontade de abrir...

Ah! ia-me esquecendo dos proselitistas de todas as religiões. Os proselitistas amadores, que são os piores. Quanto aos sacerdotes que conheço, registre-se em seu louvor que eles sempre me falam de outras coisas. Ou me julgam um caso perdido ou um caso garantido... Bem, qualquer que seja o caso, deixam-me em paz.

O que pode acontecer de mais chato no mundo é o chato que se chateia a si mesmo, o autochato.

Para essa extrema contingência, descobri em tempo que a última solução não é o suicídio. É escrever, desabafar para cima do leitor, o qual, se me leu até aqui, a culpa é toda dele.

(Mário Quintana - Caderno H, 1973)

3 comentários:

Cineri disse...

Olá profe e colegas, que ótimo termos este espaço para discutirmos. Aproveito para desejar um ´ótimo Dia das Mães para todas as mamães da turma!

Cris disse...

Eliana!
Que delícia, um blog!
Um espaço para refletirmos e nos conhecermos.
E pergunto: como não ler Quintana? Como resistir e deixar de ler seu texto até o fim?
Diz ele das Utopias
"Se as coisas são inatingíveis...ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A mágica presença das estrelas!"
In: Sapo Amarelo. ed.São Paulo: Global. 5a. edição, 2006.
Abçs
Cris

Fabi G. disse...

E tomara que assim como Quintana, também nós possamos "desabafar" sobre essa tal epistemologia por aqui... talvez não com toda a leveza e facilidade quanto ele, mas com certeza algo produziremos...